segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Psicologia do caráter

Não se mede o caráter de uma pessoa, pois os parâmetros passíveis de constatação só podem ser feitos pelo próprio indivíduo. Há pessoas bom-caráter e mau-caráter na sociedade. Eles são políticos, são trabalhadores, são médicos, pedreiros, moram nos bairros nobres, vivem na periferia, são educados, são grosseiros, são de família, são diretores, são serventes, são donos de empresas e são empregados, portanto estão em toda parte. Será possível identificar aqueles que apresentam sinais exteriores de mau-caratismo, já que, presumivelmente, todos são de bom-caráter? Alguns traços de comportamento são denunciadores daqueles que ainda não mudaram de mau-caráter para bom-caráter. Em geral, eles não tratam bem os animais e têm dificuldade em lidar com crianças, não cuidam bem da coisa pública nem reagem bem quando são contrariados por autoridades, bem como são preconceituosos quando lidam com minorias. Mas, um traço característico do mau-caráter é seu desejo de obter o que não lhe pertence, principalmente em ter exclusivamente para si o que é de todos.
Diferentemente do que se pensa, é possível mudar o caráter, mesmo quando o indivíduo apresenta o Transtorno da Personalidade Dissocial. Os que têm falhas de caráter, os marginais e aqueles que são manifestamente doentes por sublevar o direito do outro em favor de si mesmo, podem mudar graças a Educação. A base de sustentação da Pedagogia é que o ser humano pode mudar para melhor, quando submetido a processos educativos eficientes.
Alguns de nossos representantes, tachados de ladrões por causa da corrupção, podem ter certeza de que há solução para seu problema de caráter. Porém, o remédio não deve se restringir a eles, mas também ao sistema e aos cidadãos de bom-caráter. Ao primeiro, o remédio é profundo, pois há inversão de valores e existe uma filosofia dominante do egoísmo e do orgulho do querer levar vantagem sempre; ao segundo, o remédio é não se omitirem, pois contribuem para o predomínio do primeiro.

Artigo publicado no Jornal ATarde do dia 21.10.2015.

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Minha pátria

Vendo o triunfo aparente da corrupção no país, sabendo do jeitinho brasileiro e da cultura do levar vantagem em tudo, pergunto-me o que identifica minha pátria? Seriam seus símbolos nacionais? Sua bandeira ou seu hino? Seria sua língua, que, embora falada em vários países, une o povo? O carnaval, propagado como o melhor é maior do mundo? As desvastadas verdes matas? A falada hospitalidade do povo? Ou seria o fato sazonal e exclusivamente capitalista de ser a sexta economia do mundo? Estes símbolos, por mais que sejam importantes é representativos da nação brasileira não me despertam o sentimento, que gera um bom orgulho, de dizer-me brasileiro. Penso que deve existir um sentimento que vai além do nacionalismo, ou que inevitavelmente o gera, que provoca o desejo subjacente de manter seus valores e de propagar sua cultura. Mas qual a origem, a natureza e a força deste sentimento? Como fazê-lo nascer nos filhos desta pátria, além de estimular e garantir sua manutenção? Esta não é uma tarefa ou responsabilidade de presidentes ou de governos, mas um trabalho pessoal de cada cidadão, executado na consciência de cada um.
Mas eu tenho um sentimento de pátria, cuja característica principal é o fato de considerar que todos somos iguais. Penso que nasci num lugar onde se sabe que todos os habitantes do planeta são iguais e que devem ser tratados como filhos de uma mesma terra. Creio que meu sentimento, se assemelha ao existente no nordestino, que se apresenta como resiliência, determinação, perseverança ante adversidades, compaixão pelos mais fracos e o desejo permanente de que todos alcancem seu próprio brilho. Não se trata de algo que exclua os demais brasileiros, nem exacerbe regionalismos, mas que possa conter valores altruístas, que possa estimular o desejo de produzir prosperidade, bem como a construção de uma sociedade melhor. Este mesmo sentimento também está associado à ordem, à justiça social, ao cuidado com tudo que diga respeito ao bem público pertencente ao país.
Artigo publicado no jornal ATarde de 07.10.2015. 


segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Psicologia e preconceito

A base de todo preconceito é um complexo psicológico inconsciente, também conhecido como recalque. Quando se rejeita uma característica manifesta ou subjetiva em alguém, esconde-se uma dificuldade em reconhecer uma inferioridade inconsciente, cuja representação, na Consciência, é a superioridade. Preconceitos religiosos, culturais, étnicos, de gênero ou qualquer outro não são raros nem é privilégio de qualquer grupo social, visto que existem e existiram em várias épocas da história da Humanidade. Basta que nos lembremos da discriminação aos judeus, da escravidão dos negros e, mais recentemente, aos chargistas do Charlie Hebdo, na França.
Reagir ao preconceito, afirmando uma identidade e reforçando uma característica que consolide um grupo exclusivo de pessoas, pode ser tão pernicioso quanto, pois polariza-se a questão em foco, criando uma outra casta em oposição a que se combate. Esta atitude contribui para a não valorização do caráter coletivo que define a pessoa humana, privilegiando uma particularidade que tão somente faz parte da diversidade de caracteres, cujo somatório constitui o que se conhece como sendo a natureza humana. O respeito à diversidade, enxergando suas próprias diferenças, sem projetá-las nem discriminando o outro parece ser a atitude mais genuinamente humana a ser adotada.
Quando se vê um povo que, ao migrar de sua pátria e, ao tentar se inserir em outra, é discriminado há de se perguntar onde está o sentimento humanitário bem como onde anda a percepção de que somos todos participantes de uma mesma família universal? Preconceito é falência da condição humana e perda da noção de pessoa, abrigando em si o complexo patológico de inferioridade. A estigmatização de qualquer pessoa denuncia o desconhecimento dos mecanismos de defesa que dificultam a autopercepção e contribuem para a alienação de si mesmo. A mente humana possui esta e outras dinâmicas, principalmente a de colocar o indivíduo frente a frente consigo mesmo.

Publicado no Jornal ATarde de 23.09.2015.